História da Segurança Social

A proteção social é um direito humano fundamental consagrado na Constituição da República de Timor-Leste no artigo 56.º que estabelece que “todos os cidadãos têm direito à segurança e à assistência social, nos termos da lei”. 

O direito à segurança social está também presente na Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH) de 1948 no artigo 22.º , na qual consagra que:

“toda a pessoa, como membro da sociedade, tem direito à segurança social; e pode legitimamente exigir a satisfação dos direitos económicos, sociais e culturais indispensáveis, graças ao esforço nacional e à cooperação internacional, de harmonia com a organização e os recursos de cada país.”

 

Timor-Leste tem dado passos significativos na construção da cidadania, associando deveres aos direitos sociais, e protegendo os grupos vulneráveis e os que vivem em situações de pobreza, bem como todos aqueles que trabalham e contribuem para o desenvolvimento nacional. O investimento ao longo dos anos numa rede de segurança não contributiva e, mais recentemente, a aprovação da Lei do Regime Contributivo de Segurança Social, e respetiva regulamentação, demonstram o compromisso no sentido de criar um sistema de proteção social alargado e integrado para Timor-Leste. 

 

A Segurança Social integra um regime não contributivo (de cidadania) e um regime contributivo (previdencial), e porque se traduz num rendimento alternativo (substituto) ao rendimento do trabalho, quando este é inexistente ou é perdido, face a qualquer risco social ao longo do ciclo de vida, a Segurança Social desempenha um papel chave quer na redução da pobreza (e na expansão dos apoios aos grupos mais vulneráveis), quer na sua prevenção e na proteção a todos os trabalhadores (incluindo os do setor informal da economia).

 

A Segurança Social não contributiva é financiada integralmente por transferências do Orçamento da Administração Central do Estado (OAC) e tem por objetivo assegurar mínimos sociais, de modo a garantir uma vida digna e a combater a pobreza. Dirige-se, por isso, aos cidadãos não cobertos pelo regime contributivo ou com contribuições insuficientes. O regime não contributivo de segurança social materializa-se pelo pagamento de prestações sociais pecuniárias, não dependentes de contribuições, incluindo as pensões sociais e os complementos sociais para garantia de valores mínimos de pensões.

 

A Segurança Social contributiva associa direitos (a receber prestações sociais pecuniárias) a deveres (de contribuir para o sistema), é autofinanciada (pelas contribuições sociais dos trabalhadores e das entidades empregadoras) e visa proteger os trabalhadores e as suas famílias contra riscos sociais ao longo da vida, assegurando-lhes uma proteção superior, através da substituição do rendimento do trabalho em determinadas situações de perda. As prestações sociais deste regime ajudam a prevenir a pobreza, garantindo um rendimento substituto do rendimento do trabalho, o que permite a manutenção dos níveos de consumo e, assim, a dinamização da atividade económica.

 

Consagrada como direito constitucional (artigo 56.º CRDTL) e consolidada como componente da Proteção Social na Estratégia Nacional para a Proteção Social 2021-2030 aprovada pela Resolução do Governo n.º 132/2021, de 9 de dezembro, a Segurança Social em Timor-Leste tem vindo a ser construída por fases, na lógica do recomendado pela Organização Internacional do Trabalho (OIT), visando, em primeiro lugar, assegurar segurança básica de rendimentos e, depois, ir aumentando o nível de proteção.

 

Assim, em 2008 foi criado o primeiro patamar de proteção (pilar 0), relativo ao regime não contributivo de segurança social, materializado por uma prestação social – então denominada “Subsídio de Apoio a Idosos e Inválidos” (SAII) – dirigida a pessoas idosas e a cidadãos maiores de idade em situação de incapacidade permanente e definitiva para o trabalho, assegurando-lhes condições de vida digna e o acesso a serviços e cuidados essenciais, independentemente de recursos e da situação face ao emprego e ao mercado de trabalho.

 

A prestação criada em 2008 (Decreto-Lei n.º 19/2008, de 19 de junho) foi revista em 2022, tendo sido transformada numa “Pensão social” não acumulável com outros rendimentos (prestações sociais ou rendimentos do trabalho) e dirigida especificamente aos mais vulneráveis e que não têm acesso a outro tipo de proteção, garantindo-lhes um rendimento mínimo essencial, correspondente ao limiar internacional da pobreza (Decreto-Lei n.º 53/2022, de 20 de julho). A prestação cumpre, por isso, o seu principal objetivo: assegurar mínimos de dignidade e de proteção, de modo a combater a pobreza.

 

O segundo patamar de proteção diz respeito ao regime contributivo de segurança social (1.º pilar) e foi construído em duas etapas: em 2012, com o regime transitório de segurança social, para os funcionários do Estado (Lei n.º 6/2012, de 29 de fevereiro); e em 2016, com o novo regime geral para todos (Lei n.º 12/2016, de 14 de novembro). 

A base é a mesma: é um regime público, obrigatório, gerido em repartição. No entanto, o regime transitório – dirigido em exclusivo aos trabalhadores do Estado – integra apenas pensões (velhice, invalidez e sobrevivência) e é, ainda, financiado pelo Orçamento da Administração Central do Estado, não tendo sido efetivamente criadas contribuições. O regime geral é já um regime efetivamente contributivo, que associa os direitos (às prestações) aos deveres (de contribuir), e alarga a proteção a todos os trabalhadores, de todos os setores de atividade, passando a proteger também na parentalidade e nas situações de acidentes de trabalho (este último ainda por regulamentar).

 

Este segundo patamar confere uma proteção superior a quem trabalha e contribui para o regime contributivo, de forma a assegurar a manutenção do nível de vida após a reforma ou durante a vida ativa, em situações de perda do rendimento do trabalho (por exemplo, na maternidade). Por esta razão, é também importante garantir que quem contribui tem sempre acesso a uma pensão (velhice e invalidez) de montante superior à pensão social, de modo a valorizar e reconhecer o esforço contributivo. Por isso, foi criada uma pensão mínima transitória e, já em 2022, foi também aprovada pelo Governo a criação de valores mínimos de pensões dos beneficiários do regime contributivo de segurança social (Decreto-Lei n.º 51/2022, de 20 de julho). Para o efeito será pago, se necessário para atingir aquele valor mínimo garantido, um complemento social não contributivo, a acrescer ao montante da pensão resultante da aplicação da fórmula de cálculo do regime geral.

 

O regime geral de segurança social – que corresponde a este segundo patamar de proteção – é um regime público, contributivo, obrigatório e único, baseia-se em princípios de solidariedade intra e inter geracionais, e é gerido em repartição, ou seja, é um regime “benefícios definidos”, onde o risco é assumido coletivamente e os beneficiários sabem, à partida, como são calculados os valores dos benefícios que irão receber, sendo as contribuições e as prestações sociais proporcionais às remunerações declaradas à segurança social.

 

A adesão ao regime geral é obrigatória para todos os trabalhadores por conta de outrem (setor formal), dos setores público e privado, e para os empresários em nome individual (a partir de 6 de dezembro de 2022). Para todos os restantes trabalhadores (incluindo setor informal) a adesão é facultativa, sendo que para o efeito escolhem um escalão de base de incidência contributiva (indexado ao valor da Pensão Social).

 

Sendo um regime único, os deveres – designadamente de contribuir, mas também outros deveres, como o cumprimento de prazos de garantia para acesso às prestações sociais – e os direitos – às prestações sociais – são iguais para todos os trabalhadores. A taxa contributiva é também única: atualmente 10% que, no caso dos trabalhadores por conta de outrem, se reparte em 6% da responsabilidade da Entidade Empregadora e 4% da responsabilidade do trabalhador.

 

Porque é um regime de “benefícios definidos”, os trabalhadores hoje no ativo – em conjunto com as respetivas entidades empregadoras – contribuem para uma “carteira comum” e as verbas acumuladas nessa “carteira comum” são utilizadas para pagar as prestações imediatas a que os contribuintes têm direito durante a vida ativa (por exemplo, subsídio de maternidade) e para pagar as pensões de quem já deixou de trabalhar e contribuiu no passado. Ou seja, as gerações atuais estão a garantir a manutenção de rendimentos (e a capacidade de consumo) daqueles que já deixaram de trabalhar, e têm a promessa que os trabalhadores no futuro irão garantir-lhes a si os mesmos direitos. Há, portanto, uma solidariedade entre gerações e intra geração.

 

Contudo, um regime de repartição simples (pay-as-you-go) determinaria que a taxa contributiva atual fosse relativamente baixa, apenas o estritamente necessário para cobrir as prestações atuais, quando a população é muito jovem, há muitos trabalhadores a contribuir e a maioria dos futuros beneficiários ainda não cumpriu os prazos de garantia necessários para acesso aos direitos. Mas, no futuro, seria necessário um aumento substancial da taxa contributiva, para assegurar os mesmos direitos aos contribuintes, à medida que o número de pensionistas aumenta e o número de contribuintes se reduz, como consequência de futuras alterações demográficas ou de crises financeiras (e de emprego).

 

Por essa razão, a taxa contributiva aplicada no presente é superior àquela que seria estritamente necessária para pagar as prestações atuais, de modo a assegurar justiça do esforço contributivo entre as diferentes gerações: é aplicada uma taxa contributiva de equilíbrio (calculada com base em técnicas atuariais). Garante-se, assim, um excedente de contribuições nos primeiros anos/décadas, que não é alvo de repartição imediata, mas que deve ser rentabilizado para assegurar a proteção futura dos atuais contribuintes.

 

O regime geral de segurança social associa, por isso, a repartição simples à técnica de capitalização pública, que consiste na criação de um Fundo público de capitalização – o Fundo de Reserva da Segurança Social (FRSS) – onde são acumulados e rentabilizados os montantes provenientes dos excedentes das contribuições anuais que não são objeto de repartição imediata, isto é, os excedentes entre as contribuições recebidas anualmente e as prestações pagas anualmente.

 

O Sistema de Segurança Social em Timor-Leste encontra-se em permanente evolução – prevendo-se, faseadamente, a extensão da proteção em novas eventualidades – mas integra já os dois primeiros patamares de proteção recomendados pela OIT.